The Shadow Hunter

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Keep it Simple

domingo, 25 de março de 2012

Uma vez, num shopping da Barra...

Tarde de quinta-feira no shopping Downtown, na Barra da Tijuca, Rio de Janeiro. Um rapaz vestido socialmente, sentado a uma mesa no Mc Donald’s. Ele bebe refrigerante enquanto lê uma revista sobre negócios. À sua volta, a lanchonete cheia, três caixas com filas enormes. O gerente distribuindo instruções para tentar ao máximo evitar gargalos no atendimento.

As pessoas que comem em um fast food durante a semana normalmente estão em contexto de pressa e provável tensão. Apesar de muitos gostarem de hamburguer, comer nesses lugares ainda é visto como uma opção pouco saudável. Por isso, o que mais se vê são esbarrões, pessoas discutindo com os caixas, mães ralhando com os filhos, um caos completo e muito interessante.

O rapaz destoa tanto deste perfil médio ali que, mesmo sem perceberem, as pessoas caminham um pouco mais devagar perto dele. Ele está se divertindo, pois está prestando atenção em tudo isso.

À mesinha da direita, duas moças em uniforme preto, de aspecto formal pareciam aproveitar bem a hora de almoço contando o quê, apesar de inaudível, parecia claramente ser informações pretensamente sigilosas, cuidadosamente detalhadas e com os devidos julgamentos colocados sobre outras meninas de preto não presentes. À mesa grande, no fundo, perto do revisteiro, um grupo de adolescentes muito bagunceiros, com roupa de escola, um perturbando o outro num clima muito divertido. As demais outras cadeiras com pessoas em geral parecidas, entre um horário de almoço corrido e crianças fazendo algazarra.

Em certo momento entra uma mãe e três filhas, a mais velha aparentando uns doze anos, a mais nova uns sete. O aspecto da mãe era tenso. O das filhas, de quem vem levando diversas broncas devido a estresse desde cedo. A mãe manda as filhas se sentarem a uma mesa bem ao lado do rapaz. Ela pergunta o que as três querem, e dá instruções à mais velha para que a vá ajudar com o carregamento das bandejas à mesa assim que lhe fizesse sinal da fila. Esta, desatenta, ouvindo seu MP3 player assentiu sem parecer ter prestado atenção.

O rapaz sorri com a projeção da situação. Ele percebe o astral da menina mais nova. Teve tanta dó daquela atitude tão assustada e aparentemente magoada que se concentrou mais ainda naquela mesa.

A mãe naturalmente chama a filha mais velha e esta demora largos espaços de tempo para perceber. A mãe dá um berro de longe e algumas pessoas voltam a atenção para elas. A adolescente nota a mãe enfurecida e vai até o balcão ajudar e ouvir os devidos impropérios no caminho sobre a vergonha que estava fazendo a mãe passar.

Sentam-se à mesa e a mais jovem avisa com aquela carinha tímida e sofrida: “meu Milk Shake não veio...” A mãe, ainda carregada de aborrecimento, entrega a nota fiscal à menina e pede a ela mesma que peça diretamente ao gerente. A menina pegou o papel e foi andando ao meio daquele caos, com os olhos que pareciam ter aumentado até o ponto de quererem sair das órbitas. Ficou vários minutos à frente do gerente até ser finalmente notada pela operadora de caixa, que olhou com ternura: “Márcio, vê o que essa menina quer. Ela já tá aqui te olhando a um tempão.” Em instantes, ela recebeu das mãos dele o copo da bebida.

Desde certo momento em que a menina ficou parada, intimidada demais para se fazer ouvir, a mãe lhe começara a reclamar da “lerdeza” da filha em fazer coisa tão simples quanto pegar um item com o gerente. A menina, ainda com o olhos enormes, veio caminhando cruzando o corredor de passagem mais movimentado da lanchonete, segurando o copo de bebida geladíssimo com as duas mãos, colocando-o à frente dos olhos, nitidamente morrendo de medo de derrubá-lo e sofrendo com os dedinhos gelados.

Ela não deu 5 passos. Um dos adolescentes bagunceiros passou perto dela. Não a esbarrou, mas a assustou só o suficiente para que ela derrubasse o copo e derramasse seu conteúdo completamente sobre o chão ao lado das mesas, dela e do rapaz.

A mãe imediatamente começa a ralhar alto com ela:

- Olha o que você fez!!! Não basta demorar uma hora para buscar um Milk Shake e ainda derruba no chão!!! Além de lerda é estabanada. Agora senta e come a seco, que você vai ficar sem para aprender!!!

O rapaz obseva a menina sentar-se com olhos marejados, mas segurando um sofrimento que o levou abaixar a cabeça e fechar os olhos, como se estivesse ele sofrendo. Ele respirou, cuidou para parecer ler a revista durante um minuto enquanto todas da mesa ao lado começassem a comer em silêncio. Ele então se levantou calmamente. Foi até o gerente e chamou:

- Márcio?

- Pois não?

- A menina daquela mesa derrubou o Milk Shake sem querer. Não sei se você pode fazer isso, mas você não poderia dar outro a ela? – Ele o escuta enquanto observa uma funcionária limpara a sujeira.

- Sim, claro. Aqui está. Sem problema algum.

- Obrigado, Márcio.

O rapaz caminha até a mesa da família e se dirige à mãe, com uma expressão terna:

- Oi, o gerente Márcio mandou entregar outro copo para a menina.

O rapaz deixa o copo sobre a mesa, enquanto a mãe desconcertada diz um obrigado com uma autenticidade profunda e cheia de emoção. Ele percebe o olhar da menina, mas não a fita. Dá as costas para ela em direção à porta. Só depois de sete passos vira o rosto para olhá-la então. Ela o estava encarando com uma expressão curiosa, mas séria. A família dela já não mais notava o rapaz, só ela o via. Ele dá um sorriso, tombando a cabeça ligeiramente para a direita. E ela lhe sorri de volta, com um olhar totalmente encantado. Ele se vira e segue seu caminho.

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